sábado, março 03, 2007

Crónica de uma Morte Anunciada

Pedro e Pablo Vicario saíram de casa naquela noite determinados em matar Santiago Nassar, o responsável pela desonra da irmã dos dois gémeos. Fizeram questão de anunciá-lo a quem os quis ouvir, como exige este motivo para jura de morte. Passaram pelo mercado da carne onde afiaram as facas e informaram Faustino Santos da sua intenção, disseram-no também a Clotilde Armenta e a todos quantos estavam na leitaria. Em pouco tempo toda a povoação sabia do que estava prestes a acontecer, mas nem por isso fizeram o que fosse para evitar que os irmãos Vicario atingissem o seu objectivo.
Em parte não o fizeram porque acreditavam na vingança da honra de uma irmã como um motivo moralmente justo para a sentença de morte, foram por isso cúmplices silenciosos do assassinato.
Em Portugal passam-se fenómenos semelhantes ao do romance de Gabriel Garcia Marquez. Não porque vejamos a morte como única forma de vingar a desonra, nesse aspecto somos menos efervescentes do que os sul-americanos.
Existem, no entanto, crimes que por mais que nos sejam anunciados diariamente, ou até garbosamente assumidos pelos próprios, nunca verão culpados verdadeiramente punidos no nosso país, crimes como a corrupção nas autarquias ou a fraude de resultados desportivos no futebol. Na verdade, em Portugal a maioria da população não vê estes crimes como moralmente errados, ou pelo menos não lhes confere uma condenação moral relevante, sendo este o principal motivo para a sua impunidade.
Desta forma, Pedro e Pablo Vicario poderão continuar a sair de casa exibindo as suas facas e dizendo ao que vão…