sábado, outubro 31, 2009

"Que conselhos pode um escritor mais velho arrogar-se o direito de oferecer a um jovem escritor? Só se for o que ele ou ela gostaria de que lhe tivessem dito anos antes. Não te deixes desanimar! Não te ponhas a olhar pelo canto do olho, na tentativa de estabelecer comparações com os teus pares! (Escrever não é uma corrida. Na verdade, ninguém "ganha". A satisfação reside no esforço, e raramente nas eventuais recompensas que daí advêm, se é que elas existem.) E, ainda e sempre, põe no papel tudo o que te vai na alma.
Lê imenso e sem pedir desculpa. Lê o que te apetecer ler, e não o que te dizem para ler. (Como Hamlet confessa:"Eu não sei usar de aparências".) Mergulha na leitura de um escritor de quem gostes e lê tudo o que ele ou ela escreveram, incluíndo as primeiras obras. Especialmente as primeiríssimas obras. Antes de o grande escritor se ter tornado grande, para não dizer bom, ele/ela andava às apalpadelas, a tactear para ver se encontrava uma voz, exactamente como se calhar acontece contigo.
Escreve para o teu tempo, se não mesmo única e exclusivamente para a tua geração. Não é possível escrever para a "posteridade" - tal coisa não existe. Não podes escrever para um mundo que já foi, corres o risco de te dirigires, inconscientemente, a um público que não tem rosto; de tentar agradar a alguém que não se mostrará reconhecido, ou que não merece que lhe dêem esse gosto."
Joyce Carol Oates em "A Fé de um Escritor", na escrita tudo pode ser aprendido, desde a técnica narrativa à criatividade literária.

sábado, outubro 17, 2009

Graça

É pouco político o Hermes, e ainda menos ultimamente, esta referência é literária e cómica. A qualidade dos escritos de Vasco Graça Moura é grande. Transcrevo o texto assinado no Diário de Notícias do dia 30 de Setembro de 2009, está muito bem escrito apesar das opiniões duvidosas.

"O povo português acaba de demonstrar a sua fatal propensão para viver num mundo às avessas. Não há nada a fazer senão respeitá-la. Mas nenhum respeito do quadro legal, institucional e político me impede de considerar absolutamente vergonhosa e delirante a opção que o eleitorado acaba de tomar e ainda menos me impede de falar dos resultados com o mais total desprezo.
Só o mais profundo analfabetismo político, de braço dado com a mais torpe cobardia, explica esta vitória do Partido Socialista.
Não se diga que tomo assim uma atitude de mau perdedor, ou que há falta de fair play da minha parte. É timbre das boas maneiras felicitar o vencedor, mas aqui eu encontro-me perante um conflito de deveres: esse, das felicitações na hora do acontecimento, que é um dever de cortesia, e o de dizer o que penso numa situação como aquela que atravessamos, que é um dever de cidadania.
Opto pelo segundo. Por isso, quando profiro estas e outras afirmações, faço-o obedecendo ao imperativo cívico e político de denunciar também neste momento uma situação de catástrofe agravada que vai continuar a fazer-nos resvalar para um abismo irrecuperável.
Entendo que o Governo que sair destes resultados não pode ter tréguas e tenciono combatê-lo em tudo quanto puder. Sabe-se de antemão que o próximo Governo não vai prestar para nada!
É de prever que, dentro de pouco tempo, sejamos arrastados para uma situação de miséria nacional irreversível, repito, de miséria nacional irreversível, e por isso deve ser desde já responsabilizado um eleitorado que, de qualquer maneira, há--de levar a sua impudência e a sua amorfia ao ponto de recomeçar com a mais séria conflitualidade social dentro de muito pouco tempo em relação a esta mesma gente inepta a quem deu a maioria.
O voto nas legislativas revelou-se acomodatício e complacente com o status quo. Talvez por se tratar, na sua grande maioria, de um voto de dependentes directos ou indirectos do Estado, da expressão de criaturas invertebradas que não querem nenhuma espécie de mudança da vidinha que levam e que se estão marimbando para o futuro e para as hipotecas que as hostes socialistas têm vindo a agendar ao longo do tempo. O que essa malta quer é o rendimento mínimo, o subsídio por tudo e por nada, a lei do menor esforço.
Mas as empresas continuarão a falir, os desempregados continuarão a aumentar, os jovens continuarão sem ter um rumo profissional para a sua vida. Pelos vistos a maioria não só gosta disso, como embarcou nas manipulações grosseiras, nas publicidades enganosas, nas aldrabices mediáticas, na venda das ilusões mais fraudulentamente vazias de conteúdo.
A vitória foi dada à força política que governou pior, ao elenco de responsáveis que mais incompetentemente contribuiu para o agravamento da crise e para o esboroar da sustentabilidade, ao clube de luminárias pacóvias que não soube prevenir o desemprego, nem resolver os problemas do trabalho, nem os da educação, nem os da justiça, nem os da segurança, nem os do mundo rural, nem nenhuma das demais questões relevantes e relativas a todos os aspectos políticos, sociais, culturais, económicos e cívicos de que se faz a vida de um país.
Este prémio dado à incompetência mais clamorosa vai ter consequências desastrosas. A vida dos portugueses é, e vai continuar a ser, uma verdadeira trampa, mas eles acabam de mostrar que preferem chafurdar na porcaria a encontrar soluções verdadeiras, competentes, dignas e limpas. A democracia é assim. Terão o que merecem e é muitíssimo bem feito.
O País acaba de mostrar que prefere a arrogância e a banha de cobra. Pois besunte-se com elas que há-de ter um lindo enterro.
A partir de agora, só haverá mais do mesmo. Com os socialistas no Governo, Portugal não sairá da cepa torta nos próximos anos, ir-se-á afundando cada vez mais no pântano dos falhanços, das negociatas e dos conluios, e dentro de pouco tempo nem sequer será digno de ser independente. Sejam muito felizes."